As reações causadas por alterações hormonais a partir da menarca, no seu respectivo estágio do desenvolvimento: dores, alteração de humor e interação com o meio escolar;

Por Gabriela Mota Sampaio Lopes


Uma das partes mais importantes, marcantes e impactantes na vida da menina é a menarca, ou seja, a primeira menstruação.

A tensão pré-menstrual, ou TPM, ocorre alguns dias antes da menstruação e termina ao fim desta. A TPM corresponde a uma série de sintomas provocados pelas alterações hormonais que ocorrem no organismo feminino durante o ciclo menstrual. Alguns dos sintomas da TPM são as alterações de humor, a irritabilidade, dor de cabeça e nas mamas.

Diante disso a partir da menarca e das modificações corporais, a percepção de mundo também pode mudar, de acordo com a forma que a criança foi criada, como ela foi estimulada e as crenças e representações gerais que a cercam.

Dentro dessa perspectiva, Wallon traz a ideia do Eu Corporal e do Eu Psíquico: duas visões construídas nas fases iniciais do estágio de desenvolvimento da criança e que vão ser importantes, também, no momento da adolescência.

Essa diferenciação entre o espaço objetivo e subjetivo ocorre no primeiro ano de vida e é uma etapa de formação do Eu Corporal. A segunda etapa é a integração do corpo e das sensações ao corpo visual, ou seja, a junção do corpo (sentido pelo próprio sujeito) à sua imagem (vista pelos outros).

A construção do Eu Corporal é condição para a construção do Eu Psíquico, no estágio personalista. Antes disso, a criança encontra-se num estado de sociabilidade sincrética (misturas e confusões). Isso acontece porque a criança se vê indiferenciada, fundida no seu meio familiar principalmente, e mistura a personalidade própria com a dos outros.

O conflito eu-outro também acontece na adolescência (fase em que se faz primordial a reconstrução da personalidade), que é quando nasce uma nova crise de oposição, um novo modo de agir e de pensar. Essa oposição da adolescência está muito mais ligada a intelectualidade, já que a criança se pende às emoções na vivência e resolução dos conflitos e o adolescente busca suas posições em argumentos sólidos, até para fortalecer o seu conceito de segurança e autoconfiança. Para Wallon “o outro é um parceiro perpétuo na vida do eu”.

“A adolescência, que para Wallon tem início aos 12 anos com a puberdade, é marcada por transformações de ordem fisiológica, mudanças corporais impostas pelo amadurecimento sexual, assim como transformações de ordem psíquica com preponderância afetiva. Nesse estágio, os sentimentos se alternam procurando buscar a consciência de si na figura do outro, contrapondo–se a ele, além de incorporar uma nova percepção temporal”, segundo Ione Collado Pacheco Dourado (PUC/SP) e Regina Célia Almeida Rego Prandini.

Os meios social e cultural têm agora um papel crucial. Os adolescentes tornam-se resistentes no tocante às regras e ao controle exercidos e impostos pelos pais, e sentem que precisam, o quanto antes, encontrar o grupo social (principalmente de amizades) com o qual se identificam.

A partir disso, focando agora na puberdade feminina e seus efeitos, principalmente no meio escolar, pesquisas feitas no Hospital Universitário de Zurique apontam que as mudanças hormonais relacionadas ao ciclo menstrual não mostram associação com o desempenho cognitivo. Mesmo que ainda assim exista as exceções que estão estritamente ligadas ao espaço da individualidade, o desempenho cognitivo das mulheres não é, em geral, perturbado pelas mudanças hormonais que ocorrem com o ciclo menstrual. Mas os reflexos que surgem na oscilação do humor podem aparecer em qualquer pessoa, independente da tensão pré-menstrual (TPM):

“Uma paciente com TPM, eventualmente, pode ter uma produtividade menor naquele dia devido à oscilação de humor, mas não quer dizer que a capacidade cognitiva dela está alterada. Assim como um homem pode estar com um humor diferente, e também não ser produtivo suficiente por isso”, afirmou o Professor de ginecologia da UFF, Ivan Penna.

O ponto central de maior influência é a forma como a sociedade se relaciona com a menstruação e a puberdade e os tabus que giram em torno delas, fazendo com que a adolescente sofra pelas modificações biológicas e naturais do seu corpo. O surgimento dos pelos, aumento do tamanho dos seios, do quadril e das coxas, por exemplo, são elementos que surgem ao longo do tempo e geralmente a população já espera que tudo isso se encaixe num padrão criado pela própria sociedade. Toda essa ideia é passada de geração a geração, afetando o meio escolar e a forma como se dará a interação entre os adolescentes, principalmente as meninas, a partir desse momento.

Começa aí mudança de comportamento, no que se refere a uma retração por sentir vergonha do seu corpo e das mudanças pelas quais ele está passando. Toda a parte afetiva pode chegar até a ser como um emaranhado de ideias trazendo um choque de realidade e, como para Wallon afetividade e cognição não se separam, a cognição também será atingida, de modo que seja uma fase bastante conflituosa, já que essa é uma fase de reformulação das perspectivas e que se choca com esse preconceito. Nas escolas, ainda atualmente, pouco se aborda sobre os impactos sociais relacionados ao gênero feminino de toda essa estigmatização.  A desinformação também contribui para que mulheres tenham relacionamentos problemáticos e incompletos com seus corpos; por isso, podem se sentir limitadas.

Ter vergonha das alterações de humor, não aceitar as condições da menarca, não se aceitar e não permitir se conhecer por causa dessas barreiras, pode causar um declínio no desenvolvimento escolar, no que concerne ao desempenho nas aulas e na interação social. Essa fase pode ter muitas divergências e desencontros de ideias sobre si mesmo e sobre os espaços ocupados, no sentido que há muitas transformações e nem sempre o indivíduo sabe lidar. Isso tudo também está ligado com as fases da infância, na qual muitos conceitos são formulados e a noção de segurança corporal e psíquica se desenvolve. Nesses momentos que a criança separa o que faz parte dela e o que faz parte do mundo exterior, se o percurso até chegar na diferenciação tiver sido saudável, os impactos na puberdade podem ser menores.

Se a escola não pode ser usada como uma base sólida de fonte de informações necessárias na abordagem desse assunto, a família, parte principal de influência através do meio social, pode ser uma alternativa de auxílio.


REFERÊNCIAS:
SANTOS, Vanessa Sardinha dos. "Puberdade"; Brasil Escola. Disponível em: <https://brasilescola.uol.com.br/sexualidade/puberdade.htm>.  Acesso em 10 de janeiro de 2020.

BRITES, Alice Dantas. “Menstruação - Entenda essa fase do ciclo reprodutivo feminino”; Uol. Disponível em: <https://educacao.uol.com.br/disciplinas/biologia/menstruacao-entenda-essa-fase-do-ciclo-reprodutivo-feminino.htm>. Acesso em 15 de janeiro de 2020.

DOURADO, I.C.P; PRANDINI, R.C.A.R. Henri Wallon: Psicologia e Educação. São Paulo: PUC/SP.

Hospital Universitário de Zurique. “Pesquisa afirma que menstruação não afeta cognição das mulheres”; O Globo. 04 de julho de 2017. Disponível em: <https://oglobo.globo.com/sociedade/saude/pesquisa-afirma-que-menstruacao-nao-afeta-cognicao-das-mulheres-21549941>. Acesso em 15 de janeiro de 2020.

GALVÃO, Izabel. Henri Wallon: Uma Concepção Dialética do Desenvolvimento Infantil. 17ª edição. Rio de Janeiro: Petrópolis, 2004.

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