As relações de poder/saber sobre as representações da menstruação e os processos psicossociais de autopercepção e autoimagem

Por Bruna Navratilova


Desde os primórdios do desenvolvimento humano, a concepção de que as mulheres são intelectual, física e mentalmente inferiores aos homens é difundida.

Essa concepção é completamente destoante do que é visto no reino animal, vez que, a capacidade reprodutiva das fêmeas lhes garante vantagem e superioridade em algumas espécies como as abelhas e os gatos. Um grupo de 5 leoas podem sobreviver, reproduzir e caçar, precisando apenas de 1 macho que, nesse contexto, perde quase que 100% de seu valor funcional neste grupo. Contudo, na espécie humana, essa realidade é completamente diferente, visto que as mulheres não são ativas e participantes na história e perderam seu valor quase que completo diante da sociedade, possuindo local apenas como mãe, irmã ou filhas de alguém. A revista QG feminista afirma que: ‘’O poder e a dominação da espécie foi retirado das fêmeas humanas há tanto tempo que não conseguimos sequer nos recordar de sociedades em que divisão sexual do trabalho não funcionasse de maneira hierárquica, com o macho no topo da cadeia’’. Para que seja possível compreender em sua totalidade, como foi roubado das mulheres seu valor, é preciso seguir uma linha sócio-histórica que siga, desde a primeira sociedade humana, até os dias atuais.

A capacidade reprodutiva das fêmeas humanas - quando o termo ‘’capacidade’’ é utilizado, o é não para dizer que todas as fêmeas o possuem, mas para dizer que apenas elas o possuem - que nas demais espécies é vista como ‘’trunfo’’ e vantagem, na espécie humana, foi posto como prisão, a capacidade reprodutiva e todos os ligados a ela, o ciclo menstrual por completo, foram colocados como vulnerabilidade, e a dicotomia: fêmea-fraqueza e macho-força foi criada, ignorando a capacidade da fêmea de realizar tarefas físicas e intelectuais em todos os estágios do ciclo menstrual, ainda que esse cause alterações hormonais bruscas, mesmo com a tensão pré-menstrual, as cólicas, o sangramento e até a amamentação, essa inversão perigosa foi instaurada, e por meio dessa inversão, o patriarcado subjugou mulheres ao longo dos séculos e em todas as sociedades.

Esse processo de subjugação feminina, entre outras problemáticas, trouxe a tona a patologização de fenômenos naturais, na exigência de um padrão de limpeza, delicadeza e doçura, os fenômenos mais simples foram apontados como sujos, os pêlos corporais, e a menstruação. Diante desse processo de patologização, a tensão pré-menstrual foi categorizada como síndrome, constando no CID (Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde) - a saber, CID 10 N94.3. Uma mulher que fica mal humorada, estressada e irada, é chamada de louca, dita como não quista pelos homens, e a ‘’culpa’’ disso é entregue a tensão pré-menstrual, criando assim, um tabu diante da sociedade humana com relação a menstruação e os demais componentes do ciclo menstrual, causando na mulher, um constrangimento a tudo que diz respeito a esse tema.

A criação desse tabu em volta da menstruação é totalmente proposital e possui finalidade. Isso porque, quando exposta a um constrangimento acerca de algo que é de sua natureza, a fêmea se torna um indivíduo inseguro acerca de todas suas características e isso altera sua percepção sobre si mesma. Um indivíduo com uma autopercepção frágil, é, automaticamente, mais submisso e tende a se enxergar numa posição inferior ao local em que este realmente está. Esse terrorismo psicológico e físico é perceptível ao longo da história com a imposição dos mais cruéis procedimentos estéticos, do espartilho do século XVII a cinta do século XXI, da proibição do enriquecimento intelectual, as piadas depreciativas, a ridicularização dos movimentos feministas, as imposições só se tornaram mais veladas, entretanto, igualmente perigosas para a criação da autopercepção da mulher.

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