O fator genético e o alcoolismo
Acredita-se que a dependência do álcool pode estar relacionada a uma predisposição genética do indivíduo e por isso pode caracterizar-se como uma das motivações do universitário ao desenvolvimento do alcoolismo. Cabe ressaltar que a predisposição genética em si não determina a manifestação da patologia, visto que a dependência do álcool é considerada uma doença multifatorial, isto é, envolve a relação complexa de fatores genéticos e ambientais, dificultando a identificação de um agente causador (BAU, 2002, p. 185).
Ao analisar os estudos acerca do tema, existe uma série de teorias relacionadas à herdabilidade do alcoolismo. Dentre essas, destaca-se a investigação das alterações do metabolismo do álcool em que variações genéticas identificadas na enzima aldeído desidrogenase mitocondrial provocam uma menor atividade da mesma e proporcionam uma diminuição no risco de desenvolvimento do alcoolismo (AGARWAL & GOEDDE, 1992 apud BAU, 2002, p.185). Após a primeira etapa do metabolismo do álcool, uma das substâncias produzidas é o acetaldeído, que em seguida será modificado para acetato pelo aldeído desidrogenase (CORDEIRO, 1986; KACHANI et al., 2008 apud VIEIRA, 2012, p.16). “A deficiência desta enzima provoca um aumento no nível sérico de acetaldeído após o consumo de álcool” (BAU, 2002, p. 185). Em razão de sua toxicidade, o aumento dessa substância provoca reações aversivas que conduzirá o indivíduo a consumir menos álcool, fator este predominante em populações orientais (SUZUKI et al., 1994; SANTOS et al., 1995 apud BAU, 2002).
A partir da compreensão de uma doença multifatorial, tem-se que muitos genes podem estar envolvidos no processo de dependência do álcool, e por isso, interessa-nos o enfoque naqueles que mais favorecem a suscetibilidade do problema em questão (BAU, 2002, p. 186). Portanto o método de estudo mais aplicado é a da associação, que busca “estimar a variação da frequência de determinado alelo, entre a população alcoólica e uma população de controlo” (POMBO, 2012, p. 72).
Dentre os estudos revisados, é imprescindível citar àqueles que correlacionam o alcoolismo aos polimorfismos genéticos envolvidos nos sistemas de neurotransmissão serotoninérgico e dopaminérgico.
A serotonina (5-HT) caracteriza-se como um neurotransmissor, e seu transportador, o SERT (ou 5-HTT), reutiliza a 5-HT da fenda sináptica, mais uma vez para as terminações nervosas (MIDDELKOOP et al., 1993 apud POMBO, 2012, p. 115). O desempenho da transcrição do 5-HTT depende do gene que codifica o SERT e que possui dois polimorfismos: “(1) polimorfismo da zona promotora do gene que codifica o transportador da 5-HT (5-HTT_LPR) e o (2) polimorfismo VNTR (variable-number-tandem-repeats) de um intrão do gene do transportador da 5-HT (5-HTT_VTNR)” (POMBO, 2012, p.115).
O polimorfismo 5-HTT_LPR é caracterizado por 44 pares de base de inserção/delecção, dispondo de dois alelos, um “curto” (S) de baixa expressividade e um “longo” (L) de alta expressividade, em que ambos estão localizados na região promotora do gene do transportador de serotonina (LESCH et al, 1994 apud POMBO, 2012, p.115). Os maiores índices de transcrição se devem ao alelo L, que determina os níveis de serotonina na fenda sináptica, por condicionar o quanto de 5-HT será reutilizado (GREENBERG et al., 1999; HEILS et al., 1996; MACKENZIE e QUINN, 1999; MICHELHAUGH et al., 2001 apud POMBO, 2012, p.116). Bleich et al., (2007 apud POMBO, 2012) analisaram a ligação entre o 5-HTT_LPR e o desejo intenso pelo álcool (craving) nos indivíduos alcoólatras portadores do alelo “longo” (L). Diante disso, no seguinte trecho de POMBO (2012, p.116) nota-se o caráter instável da correlação desse polimorfismo em específico e o alcoolismo:
“Alguns estudos reportam a influência do alelo L (Kweon et al., 2005), outros do alelo S (Konishi et al. 2004), outros só alguns fenótipos de alcoólicos (Gerra et al., 2004; Liao et al., 2004; Limosin et al. 2005; Pascual et al., 2007) e, inclusivamente, alguns estudos confirmam que as frequências alélicas do 5-HTT_LPR não discriminam entre a população alcóolica e não-alcóolica (Choi et al., 2006; Dick et al., 2007).”
Pesquisas demonstram que o desequilíbrio do sistema serotoninérgico estaria envolvido na patogenia do alcoolismo, visto que há estudos que indicam uma “[...] diminuição na função serotoninérgica em indivíduos com problemas ao nível de controlo dos impulsos, do consumo de álcool e agressividade” (BAILEY et al., 1990; MOELLER e DOUGHERTY, 2001; PIVAC et al., 2004; SOLLOF et al. 2000 apud POMBO, 2012, p. 116). O receptor dopaminérgico D2 codificado por um gene situado na região 11q22-23 do cromossomo 11 possui um polimorfismo de restrição Taql A DRD2 localizado na região 3’UTR e possui as seguintes variantes: “o alelo A1- com mutação (T), menos frequente e o alelo A2- selvagem/wild type (C)” (POMBO, 2012, p.118). Estudos apontam um acréscimo na frequência do alelo A1 do DRD2 em doentes alcoólicos (BLUM et. al, 1990; CONNOR et al., 2002; HALLIKAINEN et al., 2003; KONISHI et al al., 2004; LAWFORD et al., 1997; LUO et al., 2005; NOBLE, 1996; PONCE et al., 2003; SASABE et al., 2007 apud POMBO, 2012), porém outros estudos tiveram conclusões negativas para a correlação do respectivo polimorfismo e o alcoolismo (BOLOS et al., 1990; GOLDMAN et al., 1997; MUNAFO et al., 2007; SANDER et al., 1999; SUAREZ et al., 1994; TURNER et al., 1992 apud POMBO, 2012).
Associações são encontradas entre determinados polimorfismo e dependências de drogas para todos os receptores. Um estudo feito examinando polimorfismos no DRD5 gene encontraram uma associação entre um polimorfismo dele e o abuso de substâncias,mediado pelo traço de personalidade em busca de novidade. O gene DRD4 é um influenciador na origem do distúrbio de atenção e hiperatividade infantil e esse traço está envolvido na vulnerabilidade às dependências. O gene DRD3 que tem papel importante na regulação de emoções apresenta resultados controversos,enquanto alguns estudos apresentam prevalência significativamente maior no alelo 1 em pacientes dependentes de álcool outros não encontram nenhuma associação. (PERES,Guilherme.)
As dependências químicas por fazerem parte das chamadas doenças complexas,que são doenças onde o efeito genético é proveniente de vários genes atuando em conjunto para produzem uma situação de vulnerabilidade, são estudadas por diferentes modalidades. Dentre elas está o
1)Estudo em famílias: Os estudos em famílias demonstram um aumento de 3 a 4 vezes mais a prevalência da dependência em parentes de primeiro grau quando comparados a indivíduos da população em geral. (MERIKAGAS citado PERES.Guilherme)
2)Estudo em gêmeos: a maioria dos estudos em gêmeos observou uma maior concordância entre os MZ em relação aos DZ,sugerindo desse modo um efeito genético com uma herdabilidade de 50-60% tanto para homens como para mulheres (COOK & GURLING,1991;PICKENS et al.,1991;MCGUE et al.,1992. citado por HENRIQUE,Claiton)
3)Estudo em adotivos: filhos de pais biológicos alcoolistas quando criados por pais adotivos não-alcoolistas apresentam um risco maior de desenvolver alcoolismo quando comparados aos filhos de não alcoólatras sujeitos ao mesmo tipo de adoção. (GOODWIN et al.,1973;CADORET & GATH,1978;BOHMAN,1978 citado por HENRIQUE,Claiton).
Comentários
Postar um comentário